Estudo da Fiocruz alerta para importância da qualificação de profissionais na ESF de Fortaleza

Uma pesquisa da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) alerta para um dos maiores desafios da Estratégia Saúde da Família: qualificar os profissionais da Atenção Primária à Saúde. Os dados foram coletados em 2019 e 2020 com base no banco de dados epidemiológicos da Prefeitura de Fortaleza e em pesquisa realizada com 366 médicos e cirurgiões-dentistas da Estratégia Saúde da Família de Fortaleza.

O estudo epidemiológico, observacional é da médica da família, pesquisadora e servidora há 16 anos da ESF de Fortaleza, Elaine Bomfim (orientada pela Prof. Anya Vieira Meyer) e faz parte da sua dissertação do Mestrado Profissional em Saúde da Família (PROFSAÚDE), que ela defendeu no final de abril, como mestranda da Fiocruz Ceará. A pesquisa teve como título: “Atenção às pessoas acometidas por hanseníase: ações realizadas por médicos e cirurgiões-dentistas da Estratégia Saúde da Família.”

Considerada um problema de saúde pública, a Hanseníase é uma doença crônica, infectocontagiosa e de notificação compulsória devido sua alta magnitude e seu alto poder incapacitante. O Ministério da Saúde a classifica como doença tropical negligenciada e sua prevalência tem estreita relação com as condições de vulnerabilidade e risco social das populações, daí a necessidade de qualificar os profissionais que atuam nas Unidades Básicas de Saúde, principal porta de entrada da população ao SUS.

Na pesquisa, Elaine Bomfim explica que 53,15% dos médicos e 33,33% dos dentistas consideram a doença relevante e um importante problema de saúde em seu território. Contudo, 47,91% dos dentistas e 42,79% dos médicos relataram que não participavam de ações educativas voltadas a hanseníase em seus processos de trabalho. Ademais, 34,69% dos entrevistados não questionavam, durante seus atendimentos aos portadores de hanseníase, sobre o acompanhamento dos contactantes, e 55,45% sobre a necessidade de vacinação BCG para contatos (formas importantes no controle da doença).

A maioria dos entrevistados pertencia ao regime estatutário, ou seja, servidores concursados, e foram eles que mais acompanharam pessoas portadoras de hanseníase. Além disso, foi a categoria profissional que mais participou de capacitações voltadas para doença. De acordo com a pesquisa, os dados são de grande relevância para as ações voltadas ao controle da hanseníase, uma vez que, quanto menor a rotatividade entre os profissionais, maior o conhecimento sobre o território e a comunidade que os cercam, gerando consequente aumento do vínculo com a população e qualidade no cuidado prestado.

Na relação com o vínculo empregatício, o estudo aponta que dos 222 profissionais médicos entrevistados, 158 (71,17%) apresentaram treinamentos em hanseníase. Dentre os estatutários, 61 (93,84%) possuíam treinamento para hanseníase, maior percentual entre os diferentes vínculos profissionais com a ESF. Com relação ao número de treinamentos e/ou capacitações voltados para o tema da hanseníase, 68,3% dos entrevistados apresentaram até três treinamentos voltados para a doença, e 27,86% dos entrevistados ainda não tinham participado de nenhum treinamento após sua graduação. Entre os profissionais analisados, apenas 66 médicos (29,72%) e 6 cirurgiões dentistas (4,16%) acompanham, atualmente, pessoas que são portadoras de hanseníase, na Unidade de Saúde onde atuam.

Outro dado interessante evidenciado foi que, apesar da ESF ser a porta de entrada do SUS e, de acordo com 98,9% dos entrevistados, o primeiro serviço de procura pelos portadores de hanseníase, o hospital de referência, Dona Libânia, ainda é o local que mais notifica casos de hanseníase em Fortaleza. Entre 2019 e 2020 houve uma redução de 9,24% nos casos novos notificados pelas Unidade Básicas de Saúde de Fortaleza, enquanto os percentuais do Hospital de referência (Hospital Dona Libânia) aumentaram 12,9% de 2019 para 2020, com 18,2% a mais de casos novos notificados, que nas UBS.

O estudo analisou também o impacto que a pandemia trouxe para o tratamento e diagnósticos de hanseníase na ESF de Fortaleza. Quanto a taxa de detecção geral de hanseníase, observou-se, entre os anos de 2019 e 2020, em um comparativo entre o estado do Ceará e a capital Fortaleza, uma importante redução de 36,31% e 25,29% respectivamente, passando, em Fortaleza, de 17,0, para 12,7 casos por 100.000 habitantes, em 2020. Porém, isto pode ter relação com a pandemia. “O distanciamento social e diminuição efetiva dos atendimentos nos centros de saúde, em todo Brasil, em decorrência da pandemia de COVID-19, ocasionou o cancelamento na continuidade de muitos tratamentos ou aumento dos adiamentos de consulta. Fato esse que pode ter gerado redução na detecção de casos novos da hanseníase”, falou Elaine.

Dados de 2021 da Organização Mundial da Saúde (OMS) mostram que o Brasil registra 17.979 casos da doença, o que corresponde a 93% dos registros nas Américas. O Nordeste é uma das regiões com maior número de casos e no Ceará, entre 2017 e 2021, de acordo com a Secretaria de Saúde do Estado, foram notificados 7.029 novos casos de Hanseníase. Desde 2016, a meta da OMS é reduzir a prevalência da doença para menos de 1 caso para cada 10.000 habitantes.

De acordo com a pesquisadora Elaine Bonfim, autora da pesquisa, para que essa redução ocorra “é necessário o fortalecimento da detecção precoce da doença, através da queda da cadeia de transmissão; detecção dos grupos de risco, por meio da busca ativa dos casos sintomáticos e contactantes e principalmente a melhoria da cobertura e acesso à saúde para populações vulnerabilizadas, defende a agora mestra.

Programas de Pós-graduação em Saúde da Família – Fiocruz Ceará

O ProfSaúde é um Programa de Pós-graduação stricto sensu em Saúde da Família, liderado pela Fiocruz. Oferecido em rede, o ProfSaúde é constituído por 22 instituições públicas de ensino superior, incluindo a Fiocruz Ceará. O programa conta com a retaguarda do Sistema Universidade Aberta do Sistema Único de Saúde (UNA-SUS).

A RENASF é a Rede Nordeste de Formação em Saúde da Família. Também atua em Rede, capitaneada pela Fiocruz Ceará, conta com 29 instituições de ensino, ofertando mestrado e doutorado em Saúde da Família, priorizando fortalecer a formação científica desses profissionais de saúde, incentivando o uso do método científico e de evidências para a tomada de decisões e para a gestão do processo de trabalho e do cuidado.

Mais informações https://ceara.fiocruz.br/portal/index.php/educacao/mestrado-e-doutorado-em-saude-da-familia/

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